Os eventos climáticos extremos estão se tornando cada vez mais frequentes e intensos ao redor do mundo, e o Brasil não é exceção.
Recentemente, a Amazônia tem enfrentado uma seca severa enquanto o Sul do país sofre com enchentes devastadoras.
Embora esses fenômenos pareçam desconectados, estão intrinsecamente ligados pela degradação ambiental, especialmente a destruição da floresta amazônica, que tem um efeito cascata significativo no regime de chuvas e nos padrões climáticos em outras partes do Brasil.
A Degradação da Amazônia
A Amazônia, a maior floresta tropical do mundo, desempenha um papel crucial na regulação do clima global. Ela atua como um sumidouro de carbono, absorvendo grandes quantidades de dióxido de carbono e ajudando a mitigar as mudanças climáticas.
No entanto, a floresta está sendo rapidamente desmatada para dar lugar a atividades agrícolas, pecuárias e de mineração. Entre agosto de 2020 e julho de 2021, a Amazônia brasileira perdeu mais de 10 mil quilômetros quadrados de floresta, um aumento de 22% em relação ao ano anterior (INPE, 2021).
Essa degradação tem impactos diretos e indiretos no clima. A perda de vegetação reduz a evapotranspiração, o processo pelo qual a água é transferida do solo para a atmosfera pelas plantas.
Isso, por sua vez, diminui a formação de nuvens e a precipitação local e regional. Estudos mostram que a Amazônia gera até 50% de suas próprias chuvas através desse ciclo hidrológico (NOBRE et al., 2016).
Efeitos em Cascata
A degradação da Amazônia não afeta apenas a região local, mas também tem repercussões em outras partes do Brasil, particularmente no Sul.
A Amazônia influencia os padrões de chuva em todo o país através dos chamados "rios voadores" —correntes de vapor d'água que são transportadas pela atmosfera desde a floresta até outras regiões.
Quando a floresta é desmatada, esses rios voadores são interrompidos, resultando em alterações significativas nos regimes de chuva.
No Sul do Brasil, essa interrupção contribui para a ocorrência de eventos climáticos extremos. A falta de umidade que normalmente seria transportada pela Amazônia pode levar a secas severas, enquanto a alteração nos padrões de circulação atmosférica pode resultar em chuvas torrenciais e enchentes.
Em setembro de 2024, o Rio Grande do Sul enfrentou chuvas recordes que resultaram em enchentes devastadoras, afetando mais de 100 mil pessoas e causando prejuízos de cerca de R$ 1 bilhão (Mídia NINJA, 2024).
Tempo de Recorrência e Históricos de Seca e Enchentes
O conceito de tempo de recorrência é fundamental para entender a frequência com que eventos climáticos extremos ocorrem.
O tempo de recorrência, ou período de retorno, é uma estimativa do intervalo médio entre eventos de igual ou maior magnitude. Por exemplo, um evento com um tempo de recorrência de 100 anos é esperado, em média, uma vez a cada século.
Historicamente, tanto a Amazônia quanto o Sul do Brasil têm experimentado eventos extremos, mas a frequência e a intensidade desses eventos estão aumentando.
No Amazonas, as secas severas de 2005 e 2010 já sinalizavam uma tendência preocupante (MARENGO et al., 2011). Essas secas foram exacerbadas por El Niño e pela contínua degradação da floresta.
No Sul, eventos de enchente como o de 1941 no Rio Grande do Sul, considerado um evento de recorrência centenária, têm sido superados por enchentes mais frequentes e intensas nos últimos anos.
Em 2015, chuvas torrenciais causaram inundações significativas na região, com um tempo de recorrência que sugeria que tais eventos estavam se tornando mais comuns (CEMADEN, 2015).
Rios Voadores: O Ciclo da Água Atmosférica
Os "rios voadores" são fluxos atmosféricos de vapor de água que se formam na Amazônia e se deslocam para outras regiões da América do Sul.
Estes rios atmosféricos carregam enormes quantidades de vapor de água, provenientes da evapotranspiração das árvores amazônicas.
Uma árvore de grande porte na Amazônia pode transpirar até 300 litros de água por dia, e toda a floresta contribui significativamente para a umidade atmosférica.
Esses rios de vapor são essenciais para a distribuição de chuvas em diversas partes do Brasil, incluindo o Centro-Oeste, Sudeste e Sul.
A água transpirada pelas árvores é transportada pelo vento, formando nuvens que eventualmente precipitam em forma de chuva.
A interrupção desse ciclo, devido ao desmatamento, reduz a umidade disponível para esses rios voadores, alterando drasticamente os padrões de chuva (NOBRE et al., 2016).
A Amazônia atua, portanto, como uma bomba biótica, captando água do solo e liberando-a na atmosfera, um processo que é crucial para manter os padrões de chuva em várias regiões.
A degradação da floresta, ao reduzir a evapotranspiração, diminui a formação desses rios voadores, impactando a quantidade e distribuição de chuvas no Sul do Brasil (ARTAXO, 2019).
Interligação dos Eventos Climáticos
Os eventos climáticos extremos observados no Brasil são reflexos das mudanças climáticas globais exacerbadas pela degradação ambiental local.
O aquecimento global, impulsionado pelas emissões de gases de efeito estufa, intensifica o fenômeno El Niño, que contribui para secas na Amazônia e chuvas excessivas no Sul do Brasil. El Niño aquece as águas do Oceano Pacífico, alterando os padrões de vento e precipitação em todo o mundo (NOAA, 2023).
Além disso, a destruição da Amazônia agrava esses efeitos ao reduzir a capacidade da floresta de regular o clima regional.
O desmatamento não apenas libera grandes quantidades de carbono na atmosfera, mas também diminui a umidade disponível para a formação dos rios voadores, essenciais para manter os regimes de chuva no Brasil (ARTAXO, 2019).
Respostas e Soluções
Para mitigar esses efeitos, é crucial adotar políticas de conservação e restauração da Amazônia. Programas de reflorestamento, a promoção de práticas agrícolas sustentáveis e a aplicação rigorosa das leis contra o desmatamento são essenciais.
A restauração da floresta pode ajudar a reestabelecer os ciclos hidrológicos e melhorar a resiliência climática da região.
Além disso, a comunidade internacional deve colaborar para reduzir as emissões globais de carbono e apoiar financeiramente iniciativas de conservação.
Investimentos em tecnologia de monitoramento ambiental e em infraestrutura resiliente também são necessários para enfrentar os impactos das mudanças climáticas.
A interligação dos eventos climáticos e a degradação da Amazônia destacam a necessidade urgente de ação coordenada para proteger os ecossistemas e mitigar as mudanças climáticas.
A preservação da Amazônia é crucial não apenas para a região local, mas para a estabilidade climática de todo o Brasil. Com políticas eficazes e colaboração internacional, é possível reverter os danos e construir um futuro mais sustentável.
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